Vereadores de Orleans explicam voto contra projeto de reestruturação administrativa
Em entrevista ao Jornal da Guarujá, os vereadores Mirele Debiasi (PSDB) e Dovagner Baschirotto (MDB) afirmam que, se o projeto retornar sem alterações em 2026, continuarão votando contra

A última sessão da Câmara de Vereadores de Orleans, na semana passada, foi marcada por debates acalorados e polêmica. O Executivo enviou dois projetos, 14 e 15/2025, que propunham uma reestruturação administrativa, incluindo a criação de três novas secretarias e o reajuste de quase 100 cargos comissionados, sem detalhar orçamento ou impacto financeiro. Pela primeira vez, ambos os projetos foram rejeitados, com o prefeito Fernando Cruzetta sofrendo derrota por 6 a 5.
Para explicar sua decisão, os vereadores Mirele Debiasi (PSDB) e Dovagner Baschirotto (MDB) detalharam os principais pontos do projeto, destacando que o conjunto de medidas apresentava riscos financeiros e políticos significativos, e que a forma como foram apresentados poderia gerar confusão entre os funcionários e a população. Eles enfatizaram a necessidade de transparência e fiscalização rigorosa do Executivo.
Motivos do voto contrário
Antes de detalhar os problemas do projeto, Mirele ressaltou que muitos funcionários esperavam reajustes que não seriam aplicados e que a criação de novas secretarias carecia de planejamento orçamentário. Segundo ela, isso reforça a necessidade de um olhar crítico por parte da Câmara.
“O projeto veio escrito que seria uma reestruturação de cargos. Todos os funcionários ficaram esperando que teriam algum tipo de reajuste no salário, mas isso não era verdade. Esse reajuste era para cargos comissionados, cargos de confiança do prefeito. E dentro deste projeto havia a criação de mais três secretarias. Em momento algum entrou na Casa um projeto específico para criação dessas secretarias. Levaram atletas para dizer que a gente é contra o esporte. Jamais somos contra o esporte, mas temos que ter responsabilidade com o dinheiro público e não podemos votar um projeto que é um bolão de reajuste de cargos para os “amigos do rei”, criando secretarias onde nem o orçamento estava previsto.”
Durante sua fala, a vereadora também demonstrou insatisfação com declarações do prefeito Fernando Cruzetta, que teria dito que a oposição trabalha contra o município. Para Mirele, essa acusação não se sustenta, já que ela própria tem buscado recursos importantes para Orleans.
“E muito me entristece quando eu ouço do Fernando, do prefeito, que a oposição trabalha contra o município. Falei aqui antes, fora do ar: a gente trouxe 500 mil reais com a deputada Giovânia de Sá para a construção de uma quadra coberta no João Paulo II. O dinheiro já está na conta, mas a obra ainda não começou. Além disso, trouxe 250 mil reais com o deputado Marcos Vieira e, na sexta-feira, tive a grata surpresa de ser procurada pelo deputado que destinou mais 300 mil reais para aplicar este ano ainda aqui no município.”
Dovagner, por sua vez, contextualizou que o projeto passou por análises e reuniões técnicas, mas mesmo assim houve tentativas de pressão sobre os vereadores minutos antes da votação. Ele apontou que a forma de apresentação do projeto buscava garantir aprovação rápida, sem permitir avaliação detalhada
“O projeto foi lido na primeira segunda-feira, analisado nas comissões, e minutos antes da sessão, que começou atrasada, foi retirado, isso é manobra política. Ficou mais uma semana na Casa para estudo. Na outra semana, o secretário de Administração voltou à Câmara para explicar novamente, mas já havia pareceres favoráveis. Para mim, foi um modo de pressionar os vereadores para votarem a favor. Mais uma vez, era um bolão, com muitos pontos que trariam um grande impacto financeiro à folha de pagamento. Não estamos aqui para travar o município; estamos aqui para fiscalizar e legislar.”
Aprovação parcial e desmembramento do projeto
Embora alguns pontos do projeto fossem considerados positivos, ambos os vereadores destacaram que o conjunto de medidas não poderia ser aprovado em bloco, pois dificultaria a análise detalhada dos impactos financeiros e administrativos. Mirele explicou que a forma como o projeto foi apresentado gerava incerteza sobre a execução das secretarias e aumentos.
“Alguns pontos do projeto eram interessantes, como a criação de uma Secretaria de Esportes e de Turismo e Cultura, mas cada uma deveria ter vindo de forma separada, com análise própria. Por exemplo, temos nosso próprio projeto para criar a Secretaria de Cultura, com orçamento definido, e poderíamos discutir secretaria por secretaria. O que o Executivo apresentou foi um bolão: secretarias no meio, reajustes no meio, mais cargos no meio. Nossa responsabilidade é com o recurso da população, e tenho certeza de que ninguém em Orleans está trabalhando para simplesmente aumentar a máquina pública com salários.”
Dovagner reforçou que a comparação com cidades maiores evidencia a desproporção do projeto, e que a aprovação poderia criar precedentes perigosos.
“Orleans tem cerca de 25 mil habitantes e já planeja seis a nove secretarias, fora a subprefeitura em Pindotiba. Muitos cargos são direcionados apenas ao prefeito e aliados. Nosso papel é fiscalizar, legislar e observar o que vem do Executivo, não dar cheque em branco. Criciúma tem 240 mil habitantes e cinco secretarias funcionando. Orleans é menor e, ainda assim, pretende ampliar o número de secretarias e cargos sem necessidade.”
Pressão de secretários
Além das questões técnicas e financeiras, ambos os vereadores relataram episódios de pressão de secretários durante a sessão, que tentaram influenciar o voto ou intimidar os parlamentares. Mirele lembrou que atitudes como essa violam princípios democráticos.
“Durante a sessão, o Ito (secretário de administração), uma pessoa que respeito e foi meu professor na faculdade, foi para a tribuna e, antes mesmo de falar qualquer coisa, disse: ‘Boa noite, presidente, estou aqui para mostrar quem é quem, população, funcionários, olhem aqui quem é quem, cada vereador, o voto de cada um’. Jamais vou aceitar que um secretário, de quem quer que seja, passe dos limites democráticos e tente intimidar o voto dos vereadores. Eu nunca tive medo de votar, e sempre que um secretário ou qualquer pessoa chegar à Casa e ultrapassar os limites, essa será a minha resposta.”
O vereador Dovagner complementou que essas ações reforçam a importância de manter a independência da Câmara.
“Mais uma vez um secretário tentou intimidar os vereadores. Não é derrota do prefeito; é vitória do município de Orleans. O aumento da folha daria cheque em branco ao prefeito, e não podemos permitir.”
Projeto poderá ser rejeitado novamente
Com a reprovação do projeto, cresce a expectativa sobre como a questão será tratada em 2026. Os vereadores deixaram claro que sua posição não é política, mas baseada na responsabilidade fiscal e na transparência, ressaltando que qualquer medida futura deve ser apresentada de forma desmembrada, para permitir análise detalhada de cada secretaria, cargo ou reajuste e garantir segurança financeira ao município. Mirele detalhou sua postura, ressaltando que não abrirá exceções caso o projeto volte sem alterações.
“Se mandar de novo em fevereiro, meu voto é contra. Se ele quiser ajudar o esporte, pode enviar a criação da Secretaria de Esporte separadamente, e terá meu apoio”, afirmou a vereadora Mirele.
Por fim, Dovagner reforçou a mesma posição e destacou que a Câmara não pode aprovar projetos em bloco que incluam aumentos e cargos sem planejamento adequado, mesmo que contenham medidas positivas.
“Se o projeto vier como veio e não mudar nenhuma vírgula, com certeza votaremos contra novamente. Desmembrados, secretarias são importantes, mas muitos cargos políticos foram prometidos durante a campanha e isso não é o momento. O país e o município precisam enxugar a máquina.”
Confira entrevista completa